Os poetas traduzem Lourenço, o Magnífico

Um conto de António Paixão e Beppe Molisano.

Lourenço de Médici (1449 – 1492) foi um banqueiro e carismático senhor feudal fiorentino, denominado “il magnifico”, por seus contemporâneos, devido às suas habilidades políticas e diplomáticas, como também pelo seu interesse pelas artes, das quais foi um dos maiores mecenas, da mesma forma que em reconhecimento pela formação de uma rica biblioteca de cerca de 15 mil volumes. Em sua época, Firenze era uma metrópole com cerca de 100 mil habitantes, 40 bancos, a principal moeda do período, o florim de ouro, havia erradicado o analfabetismo infantil e possuía 30 hospitais.

Lourenço de Médici foi patrono de Boticelli, de Michelangelo, de Leonardo da Vinci, de Rafael, de Donato Bramante, de Domenico Guirlandaio, de Fra Filippo Lippi e de Filippo Burnelleschi, arquiteto da extraordinária catedral fiorentina. Sob o seu regime desenvolveram-se as teses políticas de Machiavel, Francesco Guicciardini e Girolamo Savonarola, este último um precursor da reforma protestante, ao denunciar os excessos da Igreja da época. Ele apoiou ainda intelectuais do porte de Picco dela Mirandola, Ficino e Poliziano.

O grande líder fiorentino, Lourenço de Medici foi também um inspirado poeta transicional entre as letras medievais e renascentistas. Ele escrevia em toscano, língua que posteriormente seria oficializada como a italiana, com a unificação da Itália em 1871. Escreveu ele o festejado poema Trionfo di Bacco e Arianna, ou Triunfo de Baco e Ariana, de clara inspiração renascentista, no qual são famosos os versos:

“Quant’è bella giovinezza,
Che si fugge tuttavia!
Chi vuol esser lieto, sai:
de doman non c’è certezza”.

O poeta (também pedreiro, cantor e cozinheiro) napolitano, Beppe Molisano, chamou a atenção de seu colega António Paixão, num raro momento de sobriedade deste último, para o esplendor dos versos de Lourenço o Magnifico e, descontente com as traduções feitas, pediu sua colaboração para uma versão digna para a língua portuguesa. “Tradutori enganatori”, disse o italiano para o luso-brasileiro, celebrado como o Bardo do Bixiga onde é festejado pelas almas penadas nos bares tanto acolhedores como decadentes.

Juntos, os poetas malditos, produziram, para o benefício da lusofonia e da cultura humanística, a pérola abaixo, rara nas traduções líricas, por preservar a essência do original:
“Como é bela a mocidade,
Todavia fugaz idade!
Seja feliz quem o deseja:
Do amanhã não há certeza.”